porto alegre, dia frio...
tudo começou em um domingo de manhã. domingo de grenal, mas isso não vem ao caso. a minha história começa antes do estádio: gasômetro, beira do guaíba. e começa bem antes do jogo: seis da manhã.
nesta manhã, como em todas em mais de trinta anos, dona leda acorda as quatroemeia, toma café com cuca e sai de sua casa na rua duque de caixias as cinco para caminhar.
você pode perguntar porque ela sai tão cedo. é uma boa pergunta; porque alguém de idade, aposentada, com muito tempo livre, sai logo as cinco para caminhar?
a resposta está na família de dona leda, tanto na que ela veio quanto na que ela faz parte.
dona leda é uma senhora alemã, do interior, da colônia; ela vive para acordar cedo. de tanto seu pai falar para ela não dormir, ela se sente culpada por dormir mais do que cinco horas. e na sua idade nem precisa.
além disso, moram com ela sua filha, o marido dela e seu neto, e da. leda não entende nenhum deles.
não entende porque sua filha loira, pura e alemã casou com um brasileiro muito mais velho que não gosta de trabalhar e vive cheio de amigos suspeitos.
não entende porque sua filha passa o tempo todo falando no telefone, sendo expulsa do trabalho, não fazendo direito as coisas, não educando o filho, berrando com o marido, e passa a noite inteira gemendo em cima do marido.
não entende porque sua filha fala tanto.
não entende porque o neto só vai em casa para comer e anda com aquela gente desqualificada.
e, definitivamente, não entende porque aquela cidade berra, cospe, xinga, vomita, fede, fuma, cheira, bebe tanto.
mas dona leda encontrou duas formas de fugir disso, as louvações do pastor oscar no rádio e suas caminhadas no inicio do dia.
nessas duas coisas ela reencontrava sua cidade pequena que ela perdeu. sua juventude e suas antigas e lindas canções.
até aquela manhã de domingo...